ENQUADRAMENTO E CONCEITO
O conceito do Pólo de Saúde de Carcavelos parte da "introversão" e da "introspecção".
Edifícios com o programa-base "Saúde" tendem a ser ambíguos nos sentimentos que geram: tranquilidade (capacidade de cura) vs. medo (perigos associados à enfermidade). A arquitectura tem um papel fulcral no apaziguamento destas sensações que fazem parte da saúde e as implicações na vida do ser humano.
Também a envolvente apresenta uma fraca identidade verificada pela evolução urbanística sofrida ao longo do tempo. Desta forma, apresentamos um edifício menos "expansivo" e que se vira para o seu interior. Para tal definimos um elemento-chave no projecto que permite a introversão, introspecção, e valorizar o céu e a luz como catalisadores do que é essencial à vida: o pátio. Ao mesmo tempo que ilumina o espaço interior, o pátio também qualifica espaços de estar e de circulação, assumindo-se como peça essencial na organização do programa. Permite, ainda, uma leve e tranquila fluidez espacial, criando níveis de transparência e permeabilidade, desenhando um leque infinito de possíveis percursos ao utente, o que resulta numa oferta rica a nível perceptual.
Morfologicamente um pátio identifica-se como um vazio, sendo que o espaço, o que a arquitectura desenha, é o cheio. A nossa proposta assume-se, assim, como uma massa compacta de "espaço" num jogo evidente entre "cheios e vazios". Pretendemos uma solução volumetricamente simples, cuja horizontalidade possa transmitir tranquilidade, qual linha do horizonte. Da mesma forma que exploramos este mimetismo entre horizonte/piso único e massa, também trabalhamos o céu/horizonte/tecto, de modo a que não haja apenas uma tranquilidade a nível horizontal, como ainda uma procura pelo "levantar" e direccionar o olhar para o céu e para a luz - uma tranquilidade mais perto.
Para tal, da massa horizontal irrompem volumes de forma singular cuja localização está sempre associada a um pátio, qualificando o espaço interior com pé-direito duplo. Acentuamos a diferença entre os volumes pois representam dois momentos diferentes: os mais técnicos que permitem ao edifício sustentar-se de forma autónoma; os que remontam à ideia arquétipo de casa. Estes localizam-se sempre associados aos dois pátios de entrada dos programas diferentes, pois pretendem que se identifique rapidamente pelo exterior as entradas do edifício, associando sempre a ideia de "bem-estar'' com a sugestão da casa.
IMPLANTAÇÃO
A envolvente de Carcavelos é genericamente caracterizada por bairros residenciais e casas unifamiliares que se intercalam com edifícios de habitação colectiva. Pontualmente encontram-se alguns espaços verdes que conferem leveza ao aglomerado urbano. Na zona mais próxima ao novo Pólo de Saúde também se vêm bairros residenciais e edifícios de habitação colectiva. intercalados com equipamentos diversos:
Escola Secundária de Carcavelos, Fábrica Legrand, entre outros.
O terreno de implantação tem uma forma alongada e trapezoidal, cujo eixo maior é o longitudinal de orientação Este/Oeste, apresentando um ligeiro declive decrescente de Oeste para Este.
Outra particularidade deste terreno são os seus limites, pois conjuga duas escalas muito diferentes: uma escala mais próxima à residencial nos lados Sul e Oeste e outra escala de tráfego a Norte e a Este.
Desta forma, optámos por aproximar o edifício do lado Sul e Oeste, redesenhando o percurso pedonal, implantando-o num longo eixo longitudinal de orientação Oeste/Este, ocupando a maior parte da área disponível. A entrada do edifício está a eixo da rua Jacinto Isidoro Sousa, permitindo uma rápida identificação de quem vem da rua, e uma percepção imagética a partir do acesso a Norte.
FORMA E FUNCIONALIDADE
A nossa proposta desenvolve-se, maioritariamente, num só piso e a entrada é feita pelo piso térreo, em continuidade e à cota da rua Jacinto Isidoro de Sousa.
Neste piso térreo organizamos as três zonas diferentes, como premissa do programa preliminar: a unidade de saúde familiar, o serviço de psiquiatria e a equipa de tratamento. Foi imperativo iniciar o trabalho com a distinção das zonas e da sua distribuição sem que houvesse ao mesmo tempo uma quebra das ligações internas.
Partindo da premissa do programa, propomos três entradas diferentes: uma para a unidade de saúde familiar e serviço de psiquiatria, outra para a equipa de tratamento, e uma última para entrada apenas de staff, de modo a não haver conflito de percursos e circulações. Associados a estas entradas, pegamos no nosso elemento chave - "o pátio" - para termos ''vazios" organizadores e diferenciadores das naturezas funcionais, em torno dos quais se viram os espaços, de modo a criar e qualificar diversas ambiências.
A primeira entrada assume-se como um grande pátio marcado por uma cobertura em "cone truncado" que desenha um espaço amplo interior, marcado pela sua iluminação zenital, e de onde se inicia a distribuição funcional. Esta entrada mais "pública" contrasta com a entrada mais "resguardado" da equipa de tratamento, que se localiza num ponto oposto que permite uma maior privacidade.
O parque de estacionamento estabelece-se no piso inferior, em cave, aproveitando a métrica dos espaços do piso térreo e ocupando, parcialmente, a área de implantação do edifício. Deste piso há acessos verticais que ligam à recepção da equipa de tratamento, à recepção da unidade de saúde familiar e serviço psiquiátrico e zona de staff. No total temos 13 lugares de automóveis exclusivos para trabalhadores do Pólo de Carcavelos, dos quais 1 é para mobilidade reduzida, 8 lugares para motociclos e ainda uma zona para estacionamento de velocípedes. Para os utentes, propomos 31 lugares de automóveis, dos quais 2 são para mobilidade reduzida, e 7 lugares para motociclos. A entrada para o estacionamento, devidamente assinalada, estabelece a transição entre o percurso pedestre existente e reformulado - que faz a ligação entre a Escola Secundária de Carcavelos e a Fábrica Legrand - e o edifício, sendo um filtro entre o espaço público e o espaço do Polo de Saúde de Carcavelos.
MATERIALIDADE
Propomos evidenciar a simplicidade arquitectónica do nosso edifício, pelo que optamos por empregar materiais que, pelas suas características e durabilidade, requerem o mínimo de manutenção. Cientes da proximidade com o mar e das preocupações mais urgentes e necessárias ao nível da sustentabilidade, desde a origem do material ao factor custo /beneficio/ manutenção, optamos pelo emprego do betão branco de alto desempenho, unindo a sua função estrutural à de acabamento exterior. No embasamento propomos pacas de betão pré-fabricado em sistema de fachada ventilada, pois pode reduzir entre 30% a 50% do consumo de energia de um edifício, melhorando o conforto térmico.
Para a cobertura plana, propomos como revestimento a cobertura ajardinada pois permite uma melhoria ao nível do desempenho térmico, acústico, contribuindo ainda para a renovação do ar, essencial para a qualidade dos espaços. Propomos também um sistema de aproveitamento das águas pluviais, diminuindo a utilização do recurso hídrico potável, utilizando água pluvial reciclada para o abastecimento de espelhos de água (pátio) e nas águas das retretes das instalações sanitárias.
Tirando partido da vasta cobertura disponível do edifício, pensamos em aproveitamento de energia solar utilizando painéis solares fotovoltaicos, o que irá permitir reduzir custos de consumo de energia eléctrica.
O conforto térmico no interior é também garantido pela utilização de caixilharias de vidro duplo com corte térmico e vidros com protecção solar. O ensombramento das próprias caixilharias resulta do afastamento desta ao plano de fachada.
Em relação aos revestimentos interiores, deu-se primazia ao emprego de materiais uniformes, que correspondessem às exigências que este tipo de instituições tem. Mais concretamente, para os gabinetes de consulta e demais espaços técnicos preconizou-se pintura epoxy multicapa para os pavimentos, tanto pela sua durabilidade como por permitirem uma boa manutenção e fácil higienização. Em relação aos paramentos verticais, escolheu-se igualmente um material facilmente lavável, tal como o Esmalte Epoxi Aquoso.
Para as zonas nobres, como forma de continuidade do exterior para o interior, manteve-se nos paramentos verticais os painéis de betão pré-fabricados, e nos pavimentos, assumiu-se parcialmente a continuidade com o pavimento exterior em pedra lioz, tão característica da zona onde o edifício se insere, intercalando com zonas com a pintura epoxy multicapa, pelas mesmas razões acima referidas.